terça-feira, 22 de abril de 2008

Memórias da pane no tempo

Aos que me lêem, um bom dia.

Não sei que dia ou que ano é agora, para vocês meus leitores, mas sei que eu congelei em um dia de minha vida cinza, que se repete vez após outra, infinitamente e ininterruptamente. Todo dia, após acordas, vivo os mesmos fatos: a humilhação, a batida de carro, o orgasmo fugidio e clandestino com um completo desconhecido. Dia após dia, o tempo todo...

Mas, o que é tempo?

Eu lhes pergunto porque não mais sei o que ele é, nem o que é sua passagem. Desde sempre vivi a vida como um autômato, apenas subsistindo. Com a fatídica repetição dos dias, nada aprendi e muito esqueci.

Aliás, o que é o saber?

Vocês talvez entendam o conceito, e dele participem sem perceber. Eu abandonei a escola antes de sequer começá-la efetivamente, troquei-a por porres e libertinagem, que me levaram à vida de escravo da rotina. De meus tempos de escola disto exatos vinte anos. Este tempo afastado dos estudos enrijeceu meu cérebro; e a vida maldita enrijeceu meu espírito.

Por falar no assunto, e Deus?

Para quem quer, Deus pode ser uma força que nos rege, um salvador, uma inspiração; algo real, em suma. Mas, para quem vive uma subvida, encalacrado nos mecanismos do relógio do cosmos, vendo aurora se repetir à exaustão toda vez que se abre os olhos, vendo as mesmas pessoas, nos mesmos casos, vendo a degradação que se aloja em cada um dos seus próprios atos, sabe que "Ele" é uma alegoria pífia.

Mas, não tenho mais tempo para discorrer o assunto com vocês. Já chegam as nove horas, e o ciclo começa a se refazer para mais um dia que já ocorreu.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Hiroshima

Imagine-se em um dia ensolarado, numa cidade calma, em um dia comum. Você está andando pelas ruas da cidade, e vê pessoas despreocupadas, falando umas com as outras, carregando sacolas, indo ao trabalho ou à escola. Tudo parece normal; mas você sente algo pesado no ar.

Você olha para o céu, tentando entender essa sensação, e tudo o que você vê é um azul plácido, resplandecente, quase sem nuvens. Também sente uma brisa suave, que te passa uma sensação de paz; e você sorri...

Sorri até ver o motivo do peso no ar.

o Vulto de um anjo se forma contra a claridade branca do sol, e você se esforça para divisar as formas negras dele. Algo toma posse de sua alma, e você petrifica onde parou, e todos parecem ter sumido de seu redor.

O anjo da morte continua mergulhando do firmamento; e sua face horrenda invade tuas retinas. Você cai de joelhos, com os olhos marejados de lágrimas, sentindo o fim de tudo galopar em sua direção.

E o Anjo toca o chão...

E com ele se levanta uma nuvem de fogo e destroços, que se espalha, junto com o ódio vindo do coração desse anjo decaído. Também se espalha uma estranha energia, que te engolfa como uma onda; Você sente essa energia te consumindo, atacando cada pedaço, cada átomo do seu ser, destruindo-o e remontando-o grotescamente. Você cai no chão, seus ossos parecem em chamas, sua pele se desfaz no ar, e você ouve ao longe a hedionda gargalhada do anjo.

Não há mais luz, não há mais ar, não há mais dor.
E então, nada.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Vôo ao luar

O vento da noite soprava gélido, e fustigavaos longos cabelos negros de Anita. Ela estava encolhida na laje de seu prédio, trajando apenas uma camisola, com a pele arrepiada e os olhos marejados.

Suas lágrimas caiam como pequenos petardos salgados e mornos na calçada enquanto ela chorava em silêncio, admirando os trinta andares que a separavam do chão. Algo negro batia silencioso em seu coração e a corroia por dentro, afogando-a cada vez mais em uma espiral de sofrimentos e angústias.

Anita sentia um nó na garganta: queria pular, mergulhar ao chão, encerrar a sequência de desastres em sua vida com um encontro brusco com o solo, mas também tinha algo que a segurava. Aglo como medo, mas que vinha com o vento frio, e com o leve fprmigamento nos pés que sentia ao contemplar o fundo mergulho que o separava da rua.

Ela respira fundo, e sente seus pulmões arderem da friaca do vento noturno e outras tantas coisas, que fizeram-na se resolver.

Anita levantou-se, pos-se de pé na quina do edifício, abriu os braços, olhou a lua minguante, e esta pareceu piscar para ela. Ela inspirou de novo e deu um passo ao vazio.

A sensação doce de não ter peso invadiu-lhe o corpo, e ela sorriu enquanto ia pairando em direção ao solo, a camisola branca panejava fantasmagoricamente à parca luz do luar, e ela ria suavemente enquanto os segundos descorriam. E depois, nada.

Roupas de um negro sóbrio e olhares tristes e pesarosos permeavam o salão, odne todos perguntavam aos outros e a sí mesmos: por que Anita parecia sorri de dentro de seu caixão, à caminho do sepulcro?