quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A Cor do Mar

Estavamos os dois sentados no alto de um costão rochoso, onde lá embaixo as ondas rebentavam com um vagalhão. Ele olhava  animado para todo lado, observando o vôo dos pássaros, olhando os barcos de pescadores passando, tudo com um sorriso doce e extasiado no rosto.

Já eu estava agarrado aos meus joelhos e cabisbaixo, parecia estar olhando para os pequenos crustáceos que perambulavam pelas fendas da rocha onde estavamos mas, na verdade, estava evitando de olhar pra ele, por vergonha, e para mim, por desapontamento. Estava desapontado com minha covardia, por não poder-lhe dizer três palavras tão simples: "eu te amo".

Ainda em meio ao seu êxtase, ele vira e olha pra mim sem motivo aparente; seu cenho se franze ao me ver cabisbaixo em meio à uma cena que ele descreveria como não menos que "fantástica".

"De que cor você vê o mar?" ele me pergunta após muito me fitar intrigado e de cenho franzido.

Eu respondo, após um breve momento em silêncio pra absorver a surpresa dessa pergunta inusitada, dizendo que o via cinza, já que estavamos num dia completamente nublado e ventoso. Quase que um espelho trincado.

Ele balançou a cabeça negativamente, mas sem deixar esmorecer o sorriso, e me retruca logo em seguida, "o mar está vividamente azul".

Eu discordava completamente, mas não ia treplicar, eu não conseguia discutir com ele jamais, ainda mais com aquele sorriso doce que afoga as palavras. Soltei apenas um "ahn?" pra ver o que ele diria.

"O mar, assim  como o resto do mundo, não foi feito para ser visto somente com os olhos, quantificado, medido, classificado, posto em amostras e exsicatas e analisado em laboratórios. Ele não é só cores e formas, elementos e energia, teias e ciclos, biomas e estratos... O mundo, acima de tudo, é feito de impressões e sentimentos."

Isso me soava um pouco estranho, desde que cresci filho de um químico e uma geóloga, acostumado a ver o mundo ser desenhado como reações e aglomerados de sedimentos, e por estar ingressando na biologia, começando a enxergar o mundo como um campo de batalha onde se competia arduamente para passar seu código genético à frente. Fiquei em silêncio, e foi minha vez de olhá-lo de cenho franzido, mas sem emergir completamente do emaranhado dos meus braços, pra não mostrar que estava corando ao fitá-lo.

"As pessoas estão acostumadas a olhar o mundo como físico e palpável, por isso dizem que há lugares bonitos, lugares sem atrativos, e até lugares feios. Mas elas esquecem que o mundo é primordialmente uma coisa".

Murmurei "o que seria então?", mas meus braços abafaram a fala, e tudo o que ele deve ter ouvido foi um murmúrio surdo.

Ele se virou pra mim, olhou com olhos firmes em direção aos meus, mas o sorriso ainda doce e encantador, agarrou minha mão e a levou até seu peito. No instante que minha mão passou unida a ele, seu coração batia fortemente.

"É amor"

Corei ainda mais, mas não tinha mais meus braços pra me proteger da visão dele.

"É preciso amor pra ver do que o mundo é feito, e sua verdadeira forma. É por tê-lo que posso enxergar a essência das coisas".

"Tê-lo o quê?" eu perguntei, ainda muito vermelho, e voz vacilando.

Ele não me respondeu nada, apenas sorria ainda mais intensamente, e juntou se rosto ao meu, de olhos fechados. Juntei-me à ele nesse passeio de olhos fechados, pois não precisava sequer abrí-los pra ver que o mar estava límpido, num tom intenso de azul

2 comentários:

Unknown disse...

ameiiiiiiiiiiii
lindo e profundo
quero essa criatividade

Hiou disse...

Adorei, Zero. Parabéns.^^ Adoro essa cena do mar que vc se inspirou de Umineko. <3 Bem que podia ser baseado em história real né? xD